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Mudança de abordagem ou continuidade da estratégia?
Carta de Trump ao Irão sob escrutínio
Por Administrador
Publicado em 25/03/2025 15:48
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Nas últimas semanas, o panorama político e mediático no Irão tem sido marcado por uma intensa especulação sobre o conteúdo da carta de Donald Trump a Teerão, bem como sobre as possíveis implicações da resposta da República Islâmica.

 

Esta troca de impressões chamou a atenção tanto no país como no estrangeiro, alimentando um debate sobre as perspectivas de diálogo entre as duas nações.

Steven Witkoff, representante especial de Donald Trump para os assuntos do Médio Oriente (Ásia Ocidental), deu mais pormenores sobre a missiva numa entrevista ao jornalista norte-americano Tucker Carlson. De acordo com Witkoff, o presidente dos EUA “tem tentado construir uma relação de confiança com Teerão, a fim de evitar um conflito militar com o Irão”. Neste contexto, Trump terá escrito na carta: “Eu sou o presidente da paz. É isso que eu quero. Não há razão para resolver o problema militarmente. Temos de dialogar. Temos de eliminar os mal-entendidos.


Witkoff acrescentou que a carta também expressava a vontade de Trump de “estabelecer um sistema de verificação para que mais ninguém tenha de se preocupar com a militarização do seu programa nuclear”, sublinhando a urgência de encontrar uma solução pacífica: “Porque a outra opção nesta história não é nada boa”.

 

As recentes declarações de Steven Witkoff, o representante especial de Donald Trump para os assuntos do Médio Oriente, têm sido interpretadas no Ocidente como uma tentativa de mostrar “boa vontade” para com o Irão, qualificando-se mesmo como um afastamento significativo da política de “pressão máxima” que os EUA têm tradicionalmente mantido na sua relação com a República Islâmica. No entanto, persiste no Irão uma profunda desconfiança em relação às intenções de Washington.


Por um lado, há as garantias de Witkoff de querer criar um clima de confiança com Teerão e, por outro, as declarações do próprio Trump, que tem repetidamente ameaçado o Irão com ataques se não se conformar com os seus planos políticos regionais. Esta aparente contradição gerou o que alguns analistas vêem no Irão como uma “incongruência” na posição dos EUA. Nas últimas horas, uma nova voz foi adicionada à cacofonia da confusão em Washington: o conselheiro de segurança nacional dos EUA, Mike Waltz, disse numa entrevista que Washington quer que o programa nuclear do Irão seja completamente desmantelado.

 

A desconfiança em relação a qualquer compromisso de negociação dos EUA foi alimentada pela retirada unilateral de Trump do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA) em 2018, um acordo nuclear histórico assinado com as potências mundiais em 2015. Na altura, o acordo garantia ao Irão um alívio das sanções em troca de restrições ao seu programa nuclear. A saída de Trump e o endurecimento das sanções mostraram a Teerão que, mesmo que se chegasse a um acordo, não havia garantias de que Washington o honrasse. O Irão insistiu, portanto, que quaisquer negociações futuras devem incluir garantias práticas para evitar a repetição de experiências negativas anteriores.


Esta rutura do JCPOA é vista no Irão como uma confirmação da falta de honestidade e de empenho do Ocidente, em especial dos EUA. Na perspetiva política iraniana, o Ocidente, e mais especificamente os EUA, não está a agir de boa fé nas suas relações com a República Islâmica. De facto, o líder supremo do Irão, aquando das consultas sobre o acordo em 2015, deixou claro que, se os EUA implementassem o acordo na íntegra e com boa vontade, poderiam ser feitos progressos noutras áreas de negociação. No entanto, na perspetiva iraniana, a repetida má vontade política de Washington reforça a ideia de que o Ocidente, enquanto ideologia, actua como um poder “opressivo”, procurando dominar e oprimir os outros.

 

Neste contexto, o Irão exigiu, desde o início, uma série de condições que garantissem a presença da justiça em qualquer acordo, especialmente no âmbito do PACG. A política de “pressão máxima” de Trump, que visava forçar o Irão a aceitar restrições mais rigorosas do que as acordadas no acordo nuclear, não só falhou, como levou o Irão a reduzir progressivamente os seus compromissos nucleares. Do ponto de vista de Teerão, a retirada dos EUA do acordo deixou claro que esta estratégia não só era ineficaz, como também afectou negativamente a confiança em futuros acordos. Por conseguinte, o Irão deixará claro que não aceitará quaisquer negociações que impliquem o desmantelamento total do seu programa nuclear, argumentando que já garantiu o seu direito ao enriquecimento de urânio a 3,67% ao abrigo do JCPOA.

Além disso, uma das estratégias da administração Trump tem sido tentar arrastar o Irão para uma ampla mesa de negociações que englobe não só o seu programa nuclear, mas também as suas actividades regionais e capacidades em matéria de mísseis. No entanto, o Irão deixou claro que as suas questões de defesa e segurança nacional não estão sujeitas a negociação. Assim, embora Teerão tenha manifestado a sua vontade de encetar um diálogo diplomático, rejeita qualquer tentativa de estabelecer negociações abrangentes e alargadas.

 

Teerão tem reiterado em numerosas ocasiões que a política de sanções e a estratégia de “pressão máxima” bloqueiam qualquer possibilidade de diálogo produtivo. Esta posição foi reforçada após o segundo mandato de Trump, que intensificou as sanções. O Irão salienta que quaisquer negociações devem ter lugar num quadro de respeito mútuo, sem ameaças ou pressões.


No que diz respeito à possível resposta do Irão à carta dos EUA, vários especialistas concordam que, embora existam linhas vermelhas na diplomacia iraniana - como o seu programa de mísseis e drones - o Irão estaria disposto a negociar um novo acordo com os EUA e os outros signatários do JCPOA, demonstrando mais uma vez flexibilidade diplomática e pragmatismo político. No entanto, qualquer resposta iraniana incluirá uma mensagem clara sobre as consequências de uma eventual agressão. Teerão avisou que qualquer ataque ao seu território será objeto de uma reação decisiva.

 



Autor: Xavier Villar

 

Imagem: IA

 

Fonte: https://www.hispantv.com/noticias/opinion/612166/cambio-continuidad-enfoque-carta-trump-iran

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