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Venezuela em perigo de tornar-se um “novo Iraque”
Publicado em 20/08/2025 17:53
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Transformar a Venezuela “num novo Iraque”, foi a expressão usada ontem por Rander Peña, o vice-ministro venezuelano dos Negócios Estrangeiros para a América Latina, para classificar a ameaça militar dos EUA contra o seu país.  Peña falava numa reunião internacional, por videoconferência, com meio milhar de representantes diplomáticos, organizações sociais, partidos políticos e individualidades de todos os continentes que, em solidariedade com a Venezuela e o seu povo, expressaram a sua rejeição de qualquer intervenção norte-americana.

 

Uma declaração também de ontem da porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou que vão ser usados "todos os elementos do poder americano", numa ação militar que pode durar meses.

 

Os EUA posicionaram uma frota naval e meios aéreos, mísseis e tropas junto à Venezuela, a pretexto de “combater os cartéis do narcotráfico”, a que acusam o presidente Maduro de estar ligado. Citando a agência Reuters, a BBC noticiou a presença na segunda-feira de “três navios de guerra”, na costa Venezuelana, a que se deveria seguir a concentração de três outros vasos de guerra, os navios USS Gravely, USS Jason Dunham e USS Sampson.  “De acordo com uma fonte ouvida pela Reuters, cerca de 4.000 marinheiros e fuzileiros navais seriam mobilizados para os esforços dos EUA no sul do Caribe, além de aviões espiões P-8 e pelo menos um submarino de ataque”, acrescenta a BBC.

 

Mobilização popular armada na Venezuela

 

O Estado venezuelano mobilizou, entretanto, quatro milhões e meio de milicianos por todo o território, mantém em alerta as suas Forças Armadas de terra, mar e ar, enquanto o Ministério do Interior, dirigido pelo capitão Diosdado Cabello, vai revelando, a cada dia, descobertas de armamento e explosivos introduzidos no país e a que vincula a oposição de extrema-direita de que María Corina Machado é cabeça de cartaz.

 

Depois de frustrados dois alegados complôs para realizar atentados em zonas centrais e de simbolismo bolivariano na capital, Caracas, um novo ensaio de atentado contra uma subestação elétrica que abastece uma grande parte do país foi publicamente apresentada à comunicação social do país, por autoridades locais e centrais venezuelanas.

 

A chamada “oposição democrática” tem vindo a publicar artigos e notícias de júbilo pela intervenção militar norte-americana, ligando-a diretamente não a qualquer combate contra o narcotráfico, mas sim ao derrubamento do governo de Nicolás Maduro que, sem provas, continua a acusar de fraude, apesar de o sistema eleitoral venezuelano ser um dos mais seguros e invioláveis do mundo. Os EUA também não explicam os motivos pelos quais um dirigente político que acusam de controlar ditatorial e autocraticamente um dos países mais ricos do mundo em recursos naturais, precisaria de envolver-se no narcotráfico. O governo venezuelano e o próprio Nicolás Maduro, seguidos por outros chefes de Estado latino-americanos rejeitaram veementemente a acusação, da qual a Casa Branca não apresentou qualquer prova ou sequer indício.

 

Guerra económica

 

A nomeação, como Secretário de Estado, de Marco Rubio, descendente de uma família anticubana instalada em Miami antes ainda da revolução de Fidel Castro e Ernesto Che Guervara, deixava entrever, desde o início, uma possível opção por políticas especialmente violentas contra os países não-alinhados com os EUA na América Latina que, desde há mais de dois séculos, o poder norte-americano considera o seu quintal, ao abrigo da chamada “doutrina Monroe” e da política do “Big-Stick”.

 

A Venezuela encontra-se há uma década sob uma severa guerra económica com mais de 900 sanções decretadas pelos EUA e parceiros, retenção de bens do Estado na banca internacional (1.300 milhões de dólares da Venezuela encontram-se bloqueados em Portugal, no Novo Banco), que vem sendo agravada desde que Barack Obama declarou insolitamente o país como “uma ameaça à segurança” dos Estados Unidos.  

 

Aquelas medidas lançaram a Venezuela num caos social de empobrecimento que originou o êxodo de sete milhões de pessoas, situação pela qual as autoridades e os media “ocidentais” responsabilizaram depois os governos revolucionários de Hugo Chávez e Nicolás Maduro e de que só nos últimos dois anos o país tem vindo a conseguir recuperar, sob direção do governo revolucionário e com apoios da China, Irão, Cuba e Rússia e de uma política externa de grande diversificação e pragmatismo.

 

Trata-se de um expediente de especial crueldade contra as populações, semelhante ao que os EUA têm mantido contra outras nações, de que se destaca Cuba, sob um bloqueio económico contínuo há quase setenta anos, que tem sabotado as possibilidades de desenvolvimento do país.  

 

Num gesto considerado “cínico” pela América Latina não subordinada aos EUA, Joe Biden decretou, no último dia da sua presidência, um levantamento de sanções contra a ilha, que Trump tratou não só de repor como de agravar, imediatamente após a sua tomada.

 

Venezuela, China e Rússia

 

Idêntico é o procedimento contra a Venezuela ao anunciar na semana passada, através da Procuradoria Federal, um aumento para 50 milhões de dólares da “recompensa” para quem ajude os EUA a capturar o presidente eleito Nicolás Maduro e ao aprovar legislação que permite às suas Forças Armadas intervir na América Latina, a pretexto do combate “contra o narcotráfico” cujas organizações, reais ou meramente invocadas pelas autoridades norte-americanas, passaram para o efeito, a receber a designação de “terroristas”.

 

Permanece, entretanto, uma incógnita até que ponto China e Rússia, dois grandes parceiros económico-políticos da Venezuela, estarão disponíveis para salvaguardar o país de uma invasão norte-americana que, a acontecer, poderá começar por bombardeamentos aéreos e navais, subversão militar interna e precipitar numa nova barbárie, o estado latino-americano que detém, entre outras riquezas naturais, as maiores reservas de petróleo de mundo.

 

 

Rui Pereira

Para Notícias Independentes

 

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