A sensação, à primeira vista, é de frustração: só isto? Afinal, tanto barulho para nada?! Mas, olhando melhor, por detrás da aparente inocuidade, está uma enorme mudança - Trump e Pútin viraram a página do confronto total à beira do abismo, retomando a via do confronto regulado. Parecendo pouco, é enorme -verdadeiramente histórico.
O grande vencedor imediato é Pútin, que, de vilipendiado e ostracizado, voltou, em passadeira vermelha, pela mão (e o aplauso!) de Trump, ao grande palco da política mundial. De onde, na realidade, apesar da hostilidade ocidental, nunca chegou a sair graças aos BRiCS, engenhosa e paciente construção da diplomacia russa. Mas uma coisa é lidar com a versão contemporânea dos antigos Não Alinhados do tempo da Guerra Fria, outra falar de igual para igual com o líder da maior potência mundial, em encenação mediática de repercussão universal, prendendo as atenções de todo o mundo.
Trump, por seu turno, a coberto de uma nuvem de ameaças e zigzagues para confundir e despistar os seus poderosos adversários neoconservadores, consegue a proeza de restabelecer as relações com a Rússia praticamente contra tudo e contra todos. Compreendendo que a guerra na Ucrânia está perdida, teve a sagacidade de se colocar de fora ainda a tempo, agindo como se fosse parte neutra e evitando dessa forma para os EUA mais uma retirada sem honra nem glória como aconteceu no Vietname e no Afeganistão. Em compensação, vê abrirem-se-lhe as portas de acesso às riquezas da Sibéria e do Ártico, em cooperação com Moscovo. Não é um mau negócio.
A paz eterna está finalmente estabelecida? Não, de modo nenhum, infelizmente! Em declínio, mas ainda maior potência do planeta, os EUA continuarão a contrariar a emergência de potências rivais, em particular a China, que já se perfila no horizonte como seu principal desafio. Mesmo em relação à Rússia, não terminarão amanhã os esforços de a conter, sempre e onde puderem - do Báltico ao Cáucaso, passando pela Ucrânia. Mas, neste último caso, parece haver vontade de uma progressiva retirada, agora que a Rússia está em vias de ganhar.
Os grandes perdedores são manifestamente Zelensky e os europeus, que insistiram na guerra, totalmente alinhados com a administração Biden, primeiro, e não sabendo depois distanciar-se a tempo quando Trump sinalizou que ao excessivamente caro intervencionismo externo dos seus antecessores, preferia virar-se para dentro, a fim de Make America Great Again. É triste olhar para os protagonistas da UE neste cenário.
Obtida a certeza de que não haverá Nato na Ucrânia nem Ucrânia na Nato, os russos vão continuar a avançar até que Kíev aceite as realidades no terreno. Ou que, por força das contradições internas que tendem a acentuar-se com as derrotas, haja eventualmente uma mudança de regime naquela que foi "a primeira de todas as cidades russas".
Ou seja, de imediato, não haverá cessar-fogo. Mas o tom já mudou na relação entre Moscovo e Washington. E esse é o grande resultado desta aparentemente vazia cimeira histórica no Alasca.
Autor: Carlos Fino (Jornalista) – In Facebook
* Título do artigo da autoria do site "Notícias Independentes"