Rui Rocha começa a fazer-me lembrar o Benfica do ataque ao penta. Tudo a favor, um plantel equilibrado e o Vieira, cheio de soberba, toca de vender sem investir, imaginando que o Seixal daria conta do recado.
A IL parte para esta corrida à frente, não há grandes dúvidas disso. O Chega está em ligeira queda depois de um ano repleto de casos, o CDS não existe e é carregado pelo PSD em nome de uma sigla. Montenegro gera dúvidas no seu próprio eleitorado depois da barraca com a empresa familiar e o PS, como se percebe, ainda não convence como alternativa. Neste cenário, os liberais, calados, são a única força ao centro e direita que apareciam em alta na sequência da caldeirada em que Montenegro nos meteu.
Entretanto Rui Rocha teve que começar a falar e a coisa começa a ganhar outras formas. Eu sempre achei que a IL tinha duas dificuldades de base:
1 - mostrar regimes liberais de sucesso (vão variando sempre que dá barraca. Da Estónia à Eslováquia, dos EUA à Argentina. Sempre que os resultados mudam, a IL procura um novo el dorado).
2 - explicar a sua própria ideia de liberalismo - é comum ouvir a piadola, dita por liberais, que se dois liberais se juntam, há de imediato 3 ideias divergentes.
O problema destas teorias é que, por exemplo, a IL tem congressos onde o apoio a Millei é explicíto, ou até deputados que o assumem em direto nas televisões mas depois, quando Rui Rocha é confrontado com o tema, diz que a Argentina é lá do outro lado do Atlântico. Em resumo, a IL, para lá do marketing dos cartazes e 3 ou 4 gajos inteligentes no parlamento, não conseguiu sequer explicar o seu modelo de governação ou, até, dizer algo que não seja, na prática, o desvio do erário público para a esfera privada. Cotrim Figueiredo ou o Carlos Guimarães têm algum talento para mudar a cara dessa imagem, Rui Rocha não. É um absoluto desastre.
Ao fim de dois debates a minha dúvida está, essencialmente, na rapaziada que ajuda o Rocha a preparar os debates. Contra Pedro Nuno Santos, tal como contra Paulo Raimundo, Rui Rocha perdeu o debate na primeira intervenção que fez. Com PNS tentou o número da TAP, CP e todas as decisões enquanto ministro. Com Paulo Raimundo, ainda o primeiro minuto corria, e já falava de Cuba e da Coreia.
Esta vai de borla e, se trabalhas na campanha da IL, toma nota: é estúpido falar de Cuba, já não dá votos. Desde logo porque se tornou uma cassete insuportável. E depois, ainda mais importante, porque a maior parte da população portuguesa, ao fim de tantos debates, já sabe que vocês estão a usar como exemplo um país que sofre um bloqueio económico há 5 décadas. E notem isto...mesmo assim, é dos mais desenvolvidos naquela zona do globo. Comparem Cuba com a Jamaica, o Haiti e restantes vizinhos, para perceberem. Se comparam Portugal com Espanha, espero que não se lembrem de avaliar Cuba à luz de Singapura.
Rui Rocha foi debater com uma pessoa que sabe o preço de uma botija de gás mas que não é o Tino de Rans. Paulo Raimundo está a ser uma surpresa para mim. Não é eloquente no discurso, é uma realidade, mas apresenta-se bem preparado, com números, factos e situações reais do dia-a-dia dos portugueses.
O PCP adoptou a estratégia de discutir para as bases e de trazer os problemas cá para baixo, para o domínio do palpável. E fez bem. Seja lá quem for a equipa que ajuda Raimundo a preparar os debates, está a fazer um excelente trabalho. Viu-se, ontem, que a argumentação da IL estava estudada ao detalhe e nem a famosa PPP de Braga, que Rocha traz sempre, ficou sem resposta. Paulo Raimundo sabia a estatísticas do SNS, da habitação, da banca, das PMEs.
Rui Rocha, que também não tem o dom da oratória, segue o discurso "macro", lá por cima, sem tocar no concreto. "Temos que atrair empresas", "temos que melhorar a economia", "temos que aumentar a construção". Isto vale zero para o português comum.
Repito isto...do outro lado está um rapaz que vai à bomba buscar a botija de gás e sabe à casa decimal o custo daquela merda. E ainda a tem que carregar às costas porque, naquele apartamento, não chegou o gás canalizado.
O caso dos CTT foi um bom exemplo. É uma privatização desastrosa, julgo que não há grande dúvida, nem sequer à direita. Raimundo perguntou que vantagem teriam os portugueses com a privatização e Rocha lá lhe disse "as cartas acabam por chegar", ao que Raimundo acrescentou, "15 dias depois, mas chegam".
A estratégia da IL para estes debates está a resultar num tremendo fracasso. Até ao momento ouvimos ajustes de contas com o passado (da TAP à geringonça), repetição de chavões do Chega (Cuba, Venezuela e até o muro de Berlim) e um absoluto vazio de ideias. Nem sequer uma tentativa de explicar uma visão do liberalismo como, honra lhe seja feita, Cotrim tentava fazer. O desnorte de Rocha que, a espaços, parece um Ventura com menos jeito para falar, notou-se na última intervenção do debate, sabendo que Raimundo já não teria como responder.
O PCP é critico de Putin há 20 anos, está escrito. Quando todos apertavam a mão ao homem do gás, de Merkel a Sarkozy, de Sócrates a Cameron, já o PCP escrevia sobre o pequeno ditador. Desde que a invasão na Ucrânia começou que o PCP marcou a sua posição. Do conflito que se iniciou em 2014 à expansão da Nato, a sua posição foi simples: nem Putin, nem a guerra. Ou seja, a UE fora disso. A direita disse que isso era uma posição "miss mundo" mas a verdade é que, hoje sabemos, ter-se-iam poupado 1 milhão de vidas. Também escreveram, quase sozinhos, há 3 anos, que esta era uma guerra entre a Rússia e os EUA, à custa de sangue ucraniano. Nessa altura eram putinistas porque não queriam pagar o conflito ou mandar os filhos para lá. Hoje, este tema já não está em debate porque, entretanto, o Marco Rubio disse, palavra por palavra, a mesma coisa sobre a "proxy war". Imagino que ele não leia o Avante...
Sabendo isto, que qualquer pessoa que não vote no Chega consegue perceber, Rocha tentou o golpe baixo de dizer, novamente, que o PCP apoia o Putin. Juntou à propaganda do Ventura um conjunto de banalidades gerais, deixando Paulo Raimundo sozinho a falar nas medidas que, concordando-se ou não, o PCP julga serem melhores para a população que é, julgo que na IL não sabem disto, na sua maioria pobre.
Raimundo está a ser uma surpresa para mim e Rocha também. Por razões diferentes, como perceberão. Na minha opinião Paulo Raimundo esteve bastante melhor, uma vez que se mostrou mais bem preparado e até já aprendeu alguma matreirice, sem ser mal-educado, necessária para estes momentos. Conseguiu, julgo, passar algumas das medidas defendidas pelo PCP. Rocha ficou por generalidades e sem conseguir fugir das privatizações ou dos chavões de Cuba e Putin. A equipa da IL, sempre tão imaginativa a fazer cartazes, precisa rapidamente de acertar o passo e fazer deste rapaz algo comestível.
Nos vários canais as opiniões foram divididas, entre vitórias para um lado ou para outro e até empates. Respeito-as quase a todas e julgo que Paulo Raimundo beneficia neste momento das baixas expectativas que tinham sobre ele, em resultado das últimas legislativas.
Uma última nota para o Miguel Morgado. Era até aqui um gajo irritante e com um aspecto pouco recomendável para aparecer numa televisão à hora de jantar. Passou, desde ontem, a atrasado mental oficial. Ou vá, pessoa com défice cognitivo, que a minha mulher diz-me que atrasado mental já não se usa.
Autor: Tiago Franco In Facebook