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Lançamentos aéreos de ajuda... Uma falsa fachada humanitária para um cerco mortal e uma política sistemática de extermínio em Gaza
Publicado em 31/07/2025 19:00
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Por Wisam Zoghbour, para Diálogos do Sul Global, desde Gaza

 

 

No coração da fome e dos horrores da guerra, as ajudas são lançadas do céu sobre a Faixa de Gaza — não como um gesto de resgate, mas como uma cena escandalosa da impotência internacional e da cumplicidade da ordem global com um crime que persiste há mais de 21 meses. Em vez de romper o cerco e abrir as passagens, jogam-se pacotes sobre os famintos como se lançam migalhas aos sitiados — num teatro de humilhação coletiva da dignidade humana.

 

Admissão de um crime, não sua solução

O lançamento aéreo de ajuda não constitui solução alguma; é uma admissão inequívoca de que a ocupação israelense está deliberadamente provocando a fome de mais de dois milhões de pessoas, impedindo a chegada de alimentos, medicamentos, água potável e os elementos básicos para a sobrevivência. E se os mesmos aviões que lançam essas ajudas são aqueles que garantem proteção política e militar à ocupação, como se pode crer que seu objetivo seja nos salvar?

Esses pacotes não chegam a todos os necessitados, não saciam a fome, não tratam os doentes, nem impedem a morte lenta de crianças, mulheres e idosos deixados ao abandono entre os escombros de campos e hospitais bombardeados.

 

Manobra descarada com máscara humanitária

As chamadas “rotas humanitárias temporárias” e os lançamentos aéreos não passam de uma fachada política para limpar a imagem da ocupação e atenuar a indignação global. Tais medidas não representam qualquer alternativa real à cessação da guerra e ao levantamento do cerco. Trata-se de uma tentativa explícita de gerir a fome em vez de pôr fim a ela, de maquiar o rosto de um genocídio em curso contra a população de Gaza.

Essa manobra busca apresentar a ocupação — e os que a apoiam — como parte da solução, quando, na realidade, são os responsáveis diretos pela catástrofe: impõem severas restrições à entrada de ajuda, bloqueiam as passagens, bombardeiam centros médicos e armazéns de socorro, e impedem o restabelecimento das redes de água e eletricidade.

 

Romper o cerco: prioridade absoluta

A solução fundamental não está em fazer pingar ajuda do céu, mas em romper completamente o cerco, abrir as passagens sem restrições nem chantagens, e permitir a entrada de ajuda em volume suficiente, com mecanismos de distribuição organizados e justos, sob supervisão da ONU e da UNRWA (Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo) — cujo papel, aliás, a ocupação também tenta sistematicamente sabotar e desmantelar.

O que a população de Gaza precisa hoje é da cessação imediata do massacre, do fim da ocupação, do direito a uma vida digna, e da reconstrução do que foi destruído pela guerra — hospitais, escolas, residências e infraestrutura. Esse é o verdadeiro significado da ajuda humanitária — não os pacotes lançados entre os escombros e os mortos.

 

Apelo à responsabilidade internacional

A comunidade internacional, os países árabes e as instituições de direitos humanos devem cessar a inércia e tomar medidas concretas para interromper este crime. O silêncio já não é neutralidade — tornou-se cumplicidade. É preciso exercer pressão política, jurídica e econômica máxima sobre o Estado ocupante para pôr fim aos massacres, permitir a entrada imediata de ajuda, e assegurar ao povo palestino o direito de autodeterminação sobre sua terra, com liberdade e dignidade.

Gaza não precisa de ajuda lançada do céu — precisa da retirada da ocupação da terra. Não há dignidade sob cerco. Não há justiça sob ocupação. O lançamento aéreo de ajuda não passa de um socorro superficial às vítimas de um crime contínuo — e de um artifício para enganar a opinião pública mundial. A verdade é que Gaza está sendo massacrada, enquanto o mundo se limita a lançar pacotes sobre seus cadáveres.

 

Wisam Zoghbour é jornalista, membro da Secretaria-Geral do Sindicato dos Jornalistas Palestinos e diretor da Rádio Voz da Pátria

 

Edição de Texto: Alexandre Rocha

 

Fonte: https://dialogosdosul.operamundi.uol.com.br

 

 

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